Solidariedade e inclusão se tornam causas, condições, resultados e fatores da Santa cura
Monja Coen
Considera-se que somos um planeta com nossas mentes, fantasias e realidades. Criações mentais também são verdadeiras. Da mesma forma, no budismo há seres imaginados e fantásticos que existem entre nós.
Episódios imaginários sobre episódios verdadeiros. E, ante os rudes céus, eu pergunto a Deus: Por quê? Por quê?
“Ficou minha vida,
ao meio partida,
quando ao teu fim.
Pois contigo levas,
em meio às trevas,
metade de mim.”
Poema de Branca para Sara, sua irmã mais nova. Poema que eu recitava nos corredores do Colégio Nossa Senhora de Sion, em Higienópolis, com 13 anos de idade.
Percebia algumas irmãs me olhando de esguelha. Era tão excluída pelas outras meninas que fiz de tudo para ser reconhecida. Em vão. Então me casei, fui embora da tortura da discriminação de pré-adolescentes carentes de afeto e de inclusão social, vítimas de suas próprias famílias. Incapazes da coragem de testemunhar a outra em si mesma e a própria pessoa em outra. Lamentável. Isso ocorre quando a educação não é inclusiva. Quando familiares são o resultado de desamores, procuram por lucros e novos sabores, sem entender que dar, incluir, compartilhar e cuidar faria um bem maior à saúde física, mental e social.
Já em Londres, vivi uma situação diferente. Uma vez me deram uma laranja linda, grande, dourada. Um jovem polonês meu colega do curso de inglês. Ele era muito pobre. Guardava saquinhos usados de chá para tomar mais tarde. Um dia me trouxe essa laranja. Era tão linda que coloquei em cima da lareira do apartamento que alugara. Ficava em um porão do prédio. Da janela eu via as pernas e os pés das pessoas que andavam pela calçada. Poucas pessoas passavam por essa rua quieta. Só mesmo aquele gato preto enfeitiçado, que chegou numa noite fria.
Naquela noite o gato entrou e se acomodou na cama comigo. No dia seguinte, minha amiga me assustou:
“Você não sabe que o gato pode te matar dormindo?”
“De que jeito?”, respondi incrédula.
“Ora, ele se deita sobre sua face e você sufoca.”
Morrer sufocada por um gatinho? Que absurdo. Mesmo assim fiquei preocupada. Tantas histórias de bruxas que usam gatos, como em filmes e romances. Talvez eu não tenha aberto a porta ou a janela para ele entrar novamente.
Quem voltou foi o jovem polonês. Ficamos contentes de nos reencontrar. Eu queria mostrar que a sua laranja fora considerada tão bela e tão rara que eu não a comera. A laranja estava lá, em cima da lareira, murchando, sem que eu a houvesse tocado. Seus olhos ficaram tristes. Teria sido tão doce comer aquela fruta cara.
Ele se sentou no sofá. Recostou a cabeça e seus olhos se foram. Vazios de presença, de esperança. Não os esqueço, não. Éramos amigos e deixamos de ser por uma laranja que não virou gente.
FONTE: Revista Viva Saúde, São Paulo: Editora Escala, número 252, fevereiro/2025, pp. 40, (Espiritualidade no dia a dia)
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