Miguel Angel Bouzas
“Na solidão ela viveu,
e na solidão ela já montou seu ninho,
e na solidão seu amado a guia
sozinha,
também na solidão do amor ferido”
(João da Cruz).
Ninguém quer ficar sozinho. O ser humano é caracterizado por nossa sociabilidade, pela necessidade de nos unirmos aos outros, de manter relações cordiais, afetuosas e amorosas. Quando uma pessoa não quer ou não se sente confortável em contato com outras pessoas (se não for por algum tipo de opção pessoal, profissional ou vocacional), sabemos que ela sofre de algum tipo de patologia psicológica.
As novas redes sociais também favorecem o contato com os outros, compartilhando diferentes tipos de afinidades musicais, culturais, espirituais, solidárias… Embora também possam levar ao isolamento, ou a outros tipos de patologias, quando o mundo virtual projetado pelas novas tecnologias se confunde com o real e é preferível estar sozinho viajando por esse espaço, além dos problemas e sofrimentos presentes na realidade concreta da vida.
Tanto os idosos quanto os jovens precisam se reunir em grupos, para que possam nos ajudar a nos encontrar, a nos relacionar, a sair do nosso próprio mundo. Esse tipo de relacionamento ajuda no equilíbrio mental e na realização pessoal em vários aspectos.
Mas também é necessário nos encontrarmos sozinhos. Nossa saúde interior, que também se reflete na vitalidade física, requer solidão para refletir, para se acalmar, para encontrar nosso ser mais íntimo, o Outro que nos habita e nos dá plena identidade, para tomar as decisões importantes que só nós podemos tomar.
Na solidão, ressoam as vozes, os desejos, os rostos daqueles que nos acompanham pelos caminhos da vida. A solidão ajuda-nos a estar à vontade conosco mesmos e a nos sentirmos felizes na companhia dos outros; a conhecer-nos autenticamente: com as nossas incongruências e sucessos, com as nossas tristezas e alegrias; a nos relacionar pessoalmente com o Mistério, com o Deus da vida e do universo… Tudo isto enche de riqueza o nosso mundo interior, pouco a pouco, e ajuda-nos a entrar nele cada vez mais assiduamente, com mais entusiasmo, sem qualquer tipo de medo.
Adão sentiu-se realizado como pessoa quando descobriu e se relacionou com Eva; pois estamos apenas com o outro. “Somos o sonho de alguém e somos chamados a gerar alguém com o nosso melhor sonho” (José Arregi). Portanto, uma solidão é fecunda ou não é uma solidão saudável, porque não nos isola nas profundezas do eu egoísta e insociável, mas nos abre, nos ajuda a expandir nossa experiência existencial junto com os outros, cheios de nomes e presenças alegres que nos convidam a viver uma existência feliz.
Muitas vezes nos sentiremos felizes por estar compartilhando, no meio de uma multidão, experiências diferentes: um concerto de música, um filme, uma homenagem, uma reivindicação justa. Junto com os outros, nos sentiremos unidos a tanta bondade, a tantas esperanças e ilusões que compartilhamos com os outros. Ou também em solidariedade, com a dor, a derrota, a desilusão, a redução de direitos, a pobreza ou a injustiça. E, ao mesmo tempo, encontrar-nos-emos sozinhos, desfrutando «da música calma, da solidão sonora… que recria e faz você se apaixonar” (São João da Cruz).
“Felizes são aqueles que recebem o dom da solidão onde todos os ecos ressoam, desde o início do universo”.
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