José Knopfholz 

É tempo de travessia. Entre tantas caminhadas ímpares que a vida vem impondo, uma delas merece um destaque pela inventividade e impacto sem precedentes: a educação universitária. 

É tempo de educar para a razão com o coração. Ensinar sempre foi uma missão igualmente técnica e missionária. Como um último sopro, o educador vocacionado sempre entrou em campo certo de que se eterniza em um aprendizado constante no ciclo de energias que se constrói na ímpar relação professor-aluno. Entretanto, ensinar em tempos de COVID-19 parece reforçar o conhecido paradigma de que saber perguntar pode valar mais do que trazer dezenas de respostas cujas certezas podem se esvair em segundos. 

Sim! É tempo de certeza das incertezas e, por outro lado, é tempo de certeza da nossa única certeza. Exercitar a humildade e a humanidade nunca foi tão necessário em um sistema educacional que precisa ser mais pessoal do que nunca por detrás das teias dos computadores. É mais assertivo do que sempre ao exercitar o criticismo construtivo e a humanidade acolhedora. Se já era um desafio a construção de habilidade referenciadas de tecnicismo e emoção, a tendência do ensinar além do livro, paradoxalmente nunca esteve tão forte. 

É tempo de transmitir o que não sabemos e o que precisaremos construir. Quantas aulas sobre coronavírus nos foram dadas em nossos cursos universitários? Subitamente, o maior problema da humanidade torna-se um assunto cujo nome não constava no ementário das melhores universidades do mundo. E esse mesmo problema desencadeia a certeza de que verdadeira é apenas a busca. A verdade é, sobretudo, um caminho, não um fim. Ensinar a trilha científica das verdades nos mais diversos campos que se mesclam se torna o maior ativo de uma instituição de ensino. 

É tempo de criatividade. Em um modelo cada vez menos presencial, cabe uma reflexão sobre o paradigma temporal. Concluir um curso universitário tem que ser mais do que vencer uma corrida de obstáculos representados por disciplinas que, somadas, se constituem uma graduação. É mister sair da colcha de retalhos e, ao invés dela, construir um fluido colado pela alma humana e pela curiosidade genuína que não precisa ser igual para todos, mas que busque de cada aluno sua forma mais bela, mais vívida, mais servil e mais feliz. 

É tempo de travessia … E, como diria o poeta se não ousarmos fazê-lo, estaremos para sempre “à margem de nós mesmos”. 

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FONTE: KNOPFHOLZ, José. Pandemia e o tempo de travessia. In. Jornal Estado de Minas.  Belo Horizonte: Estado de Minas, ano 93, n. 28.402, 11/07/2020, pág. 7. (Opinião) 

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